Um dos maiores dilemas do advogado iniciante sem dúvidas é: “Devo ou não cobrar pela consultoria jurídica? Eis a questão”.

Esse de fato é um drama Shakespeariano na vida do advogado iniciante. E teria algum motivo para isso? A resposta é sim.

O primeiro motivo é o medo de “espantar” o cliente e perder para a concorrência. Pois, o advogado ao lado pode não cobrar.

O segundo é o pensamento de um investimento futuro, ou seja, não cobro agora, pego o serviço e lucro amanhã.

Outro motivo também pode ser a falta de confiança, por não ter certeza se de fato sabe resolver aquele problema. Contudo, isso é mais comum quando um advogado quer se aventurar em todas as áreas do direito e não se limita a atuar apenas na área em que é bom.

Pensando nessa celeuma profissional, eu resolvi escrever esse artigo. Nele eu vou falar se você deve ou não cobrar consultoria jurídica.

Por que cobrar a consultoria jurídica?

O “dar uma opinião”, “dar uma olhadinha”, “tirar uma dúvida” e muitas outras formas usadas pelas pessoas, quando feito por um advogado, tem um nome.

O nome disso é consultoria jurídica. Isso é um serviço prestado pelo advogado da mesma forma que um médico faz uma consulta.

Você já viu um médico particular não cobrando a consulta por medo de perder o paciente para a concorrência? É claro que não.

Alguns advogados podem ter a doce ilusão de que não cobrar consultoria jurídica é um investimento futuro. E eu digo ilusão pelo fato de que, não cobrar te traz zero garantias de que você será contratado.

Pelo contrário, tira a sua credibilidade. Você já viu algum advogado bem sucedido que não cobra consultoria jurídica? Acredito que não, sabe por quê? Pois, eles sabem o valor do tempo e do trabalho deles.

Além disso, qualquer pessoa para alcançar seus objetivos e sonhos precisa, via de regra, de dinheiro. E não é só isso. Qualquer negócio precisa de investimento financeiro para crescer.

Você sabe o valor do seu trabalho na vida das pessoas?

Bom, quando alguém procura um advogado não o faz por curiosidade sobre assuntos do direito. O faz por ter um problema e querer a solução. E isso demanda tempo e técnica, que você levou anos e investiu muito para adquirir.

Saber tudo sobre aquele problema e a forma como resolvê-lo é algo valioso para quem te procura.

Pois, na área criminal, esses problemas envolvem a liberdade de uma pessoa. Nesses casos, quanto vale a liberdade de alguém? Acredito que não tem preço.

Uma vez ouvi uma frase que se encaixa nisso:

“É justo que muito custe o que muito vale”.

Você gastou o seu tempo, que é escasso, para se dedicar ao problema de alguém que você nem conhece. Fazer isso de graça só é viável se você vir a advocacia como uma instituição de caridade.

Como uma vez eu ouvi do educador financeiro Bruno Perini:

“O dinheiro é o elogio mais sincero”.

Ele explica que uma pessoa pode te dizer “eu gosto do seu trabalho”, pode estar sendo sincera ou não. Talvez só querendo ser educada. Agora se ele encontra alguém que diz “eu gosto do seu trabalho, eu fiz o seu curso”.

Nesse caso, ele sabe que aquela pessoa pegou o dinheiro que ganhou com seu suor e trocou pelo curso dele. Pois, entendeu que aquilo que ele irá aprender no curso vale mais do que o dinheiro investido.

E é de fato isso. Aquele que quer o seu trabalho de graça não acredita que a solução do problema dele vale mais do que o dinheiro dele. A pessoa não enxerga o valor do serviço que você tem a oferecer.

Por que as pessoas têm resistência em pagar a consultoria jurídica?

Você consegue imaginar alguém chegando na banca de uma feira e levando legumes sem pagar? Isso é improvável que aconteça.

Mas quando você vai cobrar por aquela orientação que pode mudar a vida da pessoa é julgado. “Nossa, que advogado mercenário”.

E isso tem alguns motivos. Um deles é que o legume ou outro produto são tangíveis. Pois, você consegue ver e tocar, logo consegue ver que aquilo tem um valor.

A orientação prestada em uma consultoria jurídica é algo intangível, você não consegue pegar. É algo abstrato e mais difícil de ser valorado, pois você não está vendo.

Ainda que uma informação possa ter muito mais valor do que alguns objetos, nem todos reconhecem isso.

Algumas pessoas podem pensar:  “Mas o feirante teve que comprar o legume para revender”. Assim como o dono da loja de celulares, que paga pelos celulares que vende. Seria essa uma justificativa para ninguém pedir um produto de graça.

A informação parece ser algo que não demanda matéria física e mão de obra para ser feita, diferente dos objetos que compramos.

Só que aí vem o que muitos esquecem ou ignoram. O conhecimento de ser capaz de dar uma consultoria jurídica não veio de graça.

Você teve um grande investimento e dedicação com a faculdade, cursos, pós-graduações, livros, congressos e muito mais, para saber responder aquela “dúvida” disfarçada de consultoria.

Quanto vale o conhecimento?

Qualquer um pode comprar um legume ou um celular para revender em uma feira ou loja (desde que tenha o dinheiro). Contudo, com o conhecimento não basta comprá-lo. É preciso adquiri-lo. E isso não envolve apenas gastos financeiros, mas também muito tempo e dedicação.

Pense no seguinte, se você compra 2 mil reais em produto para revender, você tem produtos para serem revendidos. Isso é indiscutível.

Agora imagine pagar 2 mil reais em um curso, para adquirir determinado conhecimento e dar aula sobre aquilo. Não basta apenas comprar o curso, é preciso tempo, esforço e dedicação para dominar o conteúdo dele.

Sendo assim, você não tem a garantia de que ao final estará dominando o assunto daquele curso e podendo dar aulas.

O conhecimento vale mais que um produto, pois, você pode desembolsar o mesmo valor em ambos. Contudo, só há certeza que irá adquirir o produto, mas não acontece o mesmo com o conhecimento.

As pessoas não enxergam a consultoria jurídica como um serviço em si

Outro motivo para as pessoas terem resistência em pagar a consultoria jurídica é o seguinte:

Elas enxergam como serviço apenas o que pode ser feito pelo advogado, judicial ou de forma extrajudicial, mas não a análise para chegar a conclusão do que pode ser feito.

No caso do advogado, a pessoa enxerga como um serviço a ser pago o pedido de liberdade. Mas, não enxerga como serviço a análise da possibilidade ou não de fazer o pedido de liberdade naquele caso concreto e qual será o melhor caminho.

É o mesmo que enxergar valor na cirurgia que o médico irá fazer. Mas não enxergar valor na consulta para ser dado o diagnóstico. Para o médico saber qual cirurgia será feita, se você pode fazer essa cirurgia, se há contraindicações, tudo isso demanda esse diagnóstico.

O advogado também faz um diagnóstico, cabendo ao cliente escolher se irá fazer ou não outros serviços, como tentar o pedido de liberdade.

Pois, no caso da advocacia, antes de tentar resolver um problema, ele tem que saber qual é esse problema, os seus desdobramentos e a solução dele. E a consultoria jurídica é o instrumento certo para isso.

Devo cobrar consultoria jurídica de um amigo?

Qual advogado nunca teve um amigo que pediu aquela “forcinha grátis”? Seja em um processo já existente ou com um problema jurídico que esteja passando. É provável que isso já tenha acontecido com você.

Você não precisa pensar que cobrar os seus serviços a um amigo é feio ou errado.

Imagine que em vez de advogado você fosse dono de uma loja de celulares. Você consegue imaginar um amigo seu indo até a sua loja e pedindo um celular de graça?

Veja bem, dependendo do amigo, você mesmo faz questão de não cobrar e não há problema nisso. Agora, isso deve ser uma escolha sua, não veja isso como uma obrigação.

Se essa pessoa de fato é sua amiga e te considera, ela não vai te pedir serviços gratuitos. Ela irá reconhecer o seu valor e do seu trabalho. Pois, um amigo de verdade tem que ser o primeiro a querer o seu crescimento profissional e do seu negócio.

Devo cobrar consultoria jurídica de um parente?

Antes de falar sobre cobrar consultoria de um parente, eu vou contar uma peculiaridade sobre ser um advogado criminalista.

Eu costumo brincar que ter um advogado criminalista na família é igual a ter um médico oncologista.

E sabe qual a semelhança? É provável que você já tenha ido a um oftalmologista, ou a um dermatologista. No entanto, qual foi a última vez que você tratou um câncer?

Da mesma forma, você já teve algum problema com operadoras, um contrato ou uma multa de trânsito. Agora, qual a última vez que você foi preso, passou por uma audiência de custódia ou por um júri popular?

O advogado criminalista não atua nos problemas mais simples do cotidiano. Atua naqueles que demandam extrema urgência.

Seu parente pode não se importar em não ter um médico na família para tratar sua dor nas costas. Mas se um dia ele tiver um câncer, ele vai desejar muito ter um oncologista na família.

Da mesma forma com o advogado criminalista. Pois, ele pode não se importar por você não resolver o problema dele com a operadora de cartão. Mas o dia que for acusado de um crime, ficaria grato em ter um advogado criminalista na família.

Afinal, devo ou não cobrar de um familiar?

Sobre cobrar consultoria de um familiar, acredito que seja uma escolha do advogado. No entanto, não é errado cobrar, sobretudo de parentes mais distantes.

Acredito ser improvável alguém cobrar aos pais, filhos ou avós por um serviço advocatício. Já os demais parentes, depende da afinidade e proximidade que você tem com eles.

Pode acontecer de termos mais afinidade e carinho com um amigo do que com um parente. Pois, tem familiar que é próximo só na árvore genealógica, mas, na prática, não age nem como um colega. Nesses casos, eu não vejo problema em cobrar dessas pessoas.

O problema em atuar em outra área do direito para ajudar um parente

Como dito, em certos casos eu não vejo problema em não cobrar de um parente. Agora tem uma situação que eu não recomendo.

O problema é quando você tem que atuar em outra área do direito só para ajudar esse familiar. Acredite, isso é muito comum e pode não ser prazeroso para você. Sobretudo, quando você não tem afinidade com essa outra área.

Isso acontece porque seus parentes, assim como muitas pessoas, desconhecem o quão complexo é o trabalho do advogado. E pior, acham que advogado é tudo igual e podem atuar em todas as áreas.

No entanto, a realidade é que você vai ter que parar o seu trabalho para aprender outra área, de forma corrida e superficial. Isso é uma situação ruim e até irresponsável.

Portanto, caso algum parente te peça ajuda com uma demanda de uma área do direito que você não tem afinidade, não tenha receio em negar. Explique para ele que advogado é igual médico, pois, ninguém vai a um dermatologista para resolver um problema de coração.

Conclusão

É preciso muito esforço e dedicação para se tornar um excelente profissional. São muitas horas de estudo e prática para se adquirir conhecimento aprofundado sobre a sua área de atuação. Não se trata apenas dos anos na faculdade e do estudo para ser aprovado na prova da OAB.

Portanto, saber e cobrar pelos seus serviços será sinônimo de:

  • Enxergar o valor do seu trabalho na vida da pessoa;
  • Valorização do seu tempo e de todo esforço, dedicação e investimento que teve.

Sendo assim, não espere que ninguém reconheça isso. Cabe a você enxergar o valor que você e o seu trabalho tem e mostrar isso para quem te procura. Sobretudo, a diferença que ele faz e o quanto acrescentará na vida dessa pessoa.

Espero que esse artigo tenha deixado claro para você o valor de uma consultoria jurídica e a importância de valorizar o seu trabalho.

E você? Ainda tem dúvidas se deve ou não cobrar pela consultoria jurídica? Caso tenha alguma história peculiar sobre o assunto, compartilhe com a gente.

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