A advocacia, assim como qualquer profissão, requer experiência. Pois, só com isso nos tornamos profissionais melhores.

O advogado iniciante busca por experiência. Não vemos a hora de fazer uma audiência, falar com o juiz, inquirir testemunhas, fazer pedidos e sustentações orais.

É muito gratificante quando você faz um requerimento em audiência e é deferido. Ou quando temos o prazer de, pela primeira vez, fazer uma sustentação oral no Tribunal de Justiça.

O problema é como começar, o que fazer para ganhar experiência e construir um caminho de sucesso na advocacia.

Nesse artigo eu irei falar sobre a advocacia dativa, que é uma excelente forma de ganhar experiência no início da advocacia.

Por que existe advogado dativo?

A Constituição Federal garante a todo cidadão o acesso à justiça e ao Poder Judiciário, como prevê o artigo 5º, inciso XXXV.

Isso quer dizer que, todo cidadão que tenha algum de seus direitos violados, tem a opção de recorrer ao Judiciário. A justiça é para todos e ninguém pode ser privado ou excluído de sua proteção.

Contudo, nem todos têm condições financeiras de contratar um advogado e arcar com os custos de uma ação judicial. Entretanto, não podem os menos afortunados ficarem desamparados.

Para isso, o Estado tem a assistência jurídica gratuita, visando atender aos menos afortunados. Isso vale para todas as demandas, seja cível, trabalhista ou criminal.

No Brasil, toda pessoa que responde por um processo criminal terá que ser assistido por um advogado ou defensor público.

Diferente de outras áreas do direito, como a trabalhista, que a pessoa pode responder a um processo sem um advogado, no direito criminal isso não é possível. Caso contrário, o processo será nulo.

Dentre as várias formas do Estado possibilitar aos pobres o acesso à justiça, a mais comum é por meio da Defensoria Pública.

No entanto, pode ocorrer de a Defensoria Pública não ser o suficiente para atender a todas as demandas. Seja pelo seu excesso ou pela ausência de Defensoria Pública em algumas comarcas pelo Brasil.

Nesses casos, para suprir essa falta o Estado contrata o advogado dativo, que é pago pelo Estado para atuar em favor de uma pessoa que não tem condições de contratar um advogado particular.

Essa pessoa não tem como escolher quem será seu advogado. Pois, a nomeação é feita de forma aleatória, respeitando a ordem da lista de advogados dativos.

Como atuar como advogado dativo?

O advogado não é chamado de forma aleatória para atuar como dativo. Para se tornar advogado dativo é preciso se inscrever em uma lista e esperar ser chamado.

Todo ano a seccional da OAB de cada estado abre inscrições para dativo, em data e hora pré-determinadas. Para saber dia e hora basta acompanhar pelo site da OAB de seu estado ou entrar em contato com eles.

A lista é feita por ordem de inscrição, ou seja, daquele que se inscreveu primeiro até o que se inscreveu por último.

Essa lista é enviada ao Tribunal de Justiça e distribuída para os fóruns das respectivas comarcas em que o advogado se inscreveu.

Assim, conforme surgirem demandas, os advogados são chamados, respeitando a ordem de inscrição.

Em geral, a quantidade de advogados que se inscreve é grande. Sendo assim, é necessário se inscrever o mais breve possível, para não ir para o final da lista. Caso contrário, pode demorar muito para te chamarem ou até mesmo isso não acontecer.

O advogado dativo será nomeado para ações aleatórias, dentro da área de atuação escolhida. Além disso, ele irá atuar como patrono de uma pessoa aleatória.

O advogado pode negar ou aceitar a nomeação, seja por motivos de foro íntimo ou por algum motivo em específico. Caso negue, chama-se o próximo da lista.   

Quais as vantagens de atuar como advogado dativo?

Adquirir experiência

Todo estudante de direito, após se formar e pegar a carteira da OAB só quer uma coisa, começar a advogar.

O sonho de abrir um escritório e se tornar um grande advogado é algo que vem sendo nutrido desde a graduação.

No entanto, é comum que o advogado em início de carreira não consiga uma vaga em um escritório para começar a atuar e ganhar experiência.

Essa também é uma fase que você está se inserindo no mercado e começando a fazer clientes.  Contudo, não tem muita experiência com audiências e todo o resto.

Algumas pessoas nem tiveram a oportunidade de estagiar ou fazer a prática jurídica na faculdade. Portanto, se formaram com experiência zero em advogar.

Inclusive, no início da carreira, muitas vezes pegamos causas que nem são da área que pretendemos seguir.

A advocacia dativa serve para te ajudar com essa experiência inicial que você precisa. Sobretudo, por ser possível a escolha da área de atuação. Assim, facilita o ganho de experiência no ramo do direito que você pretende seguir carreira.

Pode ser também o caso de você conseguir vaga em um escritório. No entanto, você precisa atuar em outras áreas, diferente da que você quer seguir carreira.

Nesse caso, a advocacia dativa pode suprir essa lacuna, claro, se você conseguir conciliar as coisas.

Pode ser também que você queira investir em si mesmo.  Aventurando-se na carreira solo em seu próprio escritório.

Iniciar sua atuação no júri

O Tribunal do Júri é um mundo à parte, quase uma outra área do direito. Pois, demanda muito conhecimento e estratégias específicas do advogado. 

O plenário do júri é diferente de qualquer audiência. Sendo assim, não adianta muita coisa ter experiência em audiências, mas não em plenário do júri.

Inclusive, muitos advogados têm medo de fazer júri, sendo isso compreensivo. Pois, é um dos momentos que mais exige preparo técnico e emocional do advogado.

Outra situação é que dificilmente alguém contrataria um advogado iniciante para um júri. Sobretudo com vários nomes consolidados no mercado.

Portanto, a advocacia dativa é uma ótima forma de se inserir nessa área, principalmente por você não lidar com um cliente particular. Não que você falte com dedicação e esmero, mas a pressão é menor.

Possibilidade de ter contato com muitas partes do processo, juízes e promotores

A atuação como dativo também permite a possibilidade de atuar em várias comarcas. Isso possibilita ter contato com juízes, promotores e partes do processo.

Portanto, aumenta o seu acervo sobre a formas de atuação dos membros do judiciário e do comportamento das partes.

Eu já vi promotores aplicando o princípio da insignificância no crime de porte de drogas. No entanto, a grande maioria não faz isso.

Também já vi comarcas em que o Juizado Especial aplica duas transações penais dentro do prazo de 5 anos, mesmo a lei dizendo que só é possível uma.

Portanto, esse contato com diversos cenários só irá aumentar a sua bagagem e te dará muito mais experiência.

Fazer network e possibilitar possíveis futuros clientes

Pode acontecer de uma pessoa que você defendeu como dativo te contratar como advogado particular para uma nova demanda. 

Até mesmo os familiares dessa pessoa podem se encantar com o seu trabalho e te indicar para outras pessoas.

Quais as desvantagens de atuar como advogado dativo?

Demora no pagamento

Uma grande desvantagem é a demora no pagamento. Pois, quem te paga é o Estado e todos sabem que uma das marcas registradas do Estado é a morosidade.

Honorários baixos

Outra grande desvantagem são os valores dos honorários. Pois, são muito abaixo da tabela da OAB ou do valor que você cobraria como advogado particular.

Contudo, se você encarar a advocacia dativa como uma forma de ganhar experiência e não depender financeiramente disso, isso não será um problema para você.

Possíveis cobranças de partes do processo ou de familiares

Um problema, que pode acontecer é uma pessoa que você está defendendo, ou os familiares dela cobrarem providências por algo que vai além da sua atuação ou que não dependem só de você. 

Pagar para trabalhar

Alguns estados, como é o caso do Espírito Santo, os processos criminais ainda são processos físicos.

No entanto, por ser o Espírito Santo um estado pequeno, é possível que você atue em várias comarcas do interior.

Nesses casos, você terá gastos com diligências, com cópias de processos e protocolos. Pois, dependendo da distância, o tempo gasto e o valor da gasolina não compensam que você faça isso. 

Nos casos de audiência presencial, os seus gastos incluirão gasolina e alimentação.

Sendo assim, tudo isso deve ser levado em conta e posto na balança. Sobretudo, na hora de escolher as comarcas de atuação, pois, a distância de algumas pode fazer não valer a pena.

Possibilidade de tempo e dinheiro perdido

Em Audiência

É possível que você gaste com diligências, estude o processo e na hora da audiência o acusado tenha contratado um advogado. Caso isso aconteça você será retirado do processo, para que o particular atue.

O pior é quando a audiência é em outra comarca, sobretudo em lugares mais afastados. O que pode acontecer também é de a audiência ser cancelada e não te avisarem.

O que pode ser feito para evitar isso é:

  • Entrar em contato com a vara no dia anterior ou no dia, para confirmar se houve algum imprevisto e se a parte constituiu advogado particular.
  • Acompanhar o andamento do processo, para verificar possíveis juntadas de procuração de um advogado particular.

Infelizmente, caso a audiência seja cancelada na hora ou o réu apareça com um advogado, nada poderá ser feito.

Em Plantão

Há uma opção de atuar como advogado dativo plantonista. Isso é algo digamos que arriscado.

Pode acontecer de você se deslocar para um lugar longe e o plantão não acontecer. Seja por problemas técnicos ou até conflitos de horários e agenda do próprio fórum.

Também pode acontecer de todos os acusados chegarem lá com advogado particular e sua atuação não ser necessária.

Outra situação é você se inscrever para atuar em processos criminais e uma vara única te chamar para um plantão cível.

O que pode ser feito para evitar isso é:

  • Entrar em contato com o fórum, para confirmar o plantão;
  • Perguntar sobre a existência de advogados particulares nos processos;
  • Perguntar se o plantão é da área de atuação em que você se inscreveu para atuar.

Contudo, nem todos esses contratempos podem ser 100% evitados.

Tirando esses contratempos, o plantão pode te trazer muita experiência. Pois, você pode fazer várias audiências no mesmo dia, às vezes até na modalidade online.

Eu já fiz 14 audiências em um mesmo dia e posso dizer que a variedade de causas, partes e a experiência adquirida foram enormes.

Despreocupação do judiciário se o advogado terá tempo para se preparar

Em alguns casos você é nomeado em cima da hora. Seja em um plantão que você está fazendo ou para uma audiência daquele dia ou para o dia seguinte.

Não é difícil imaginar como é difícil cair de paraquedas em um processo, sem saber nada sobre a causa. Inclusive, alguns processos são enormes, o que exigiria um tempo considerável para você se inteirar.

Imagine você ser nomeado para a próxima audiência, em um processo de dois volumes, sem tempo para folhear o processo. Isso aconteceu comigo e eu precisei pedir ao juiz pelo menos alguns minutos para analisar os autos.

Muitas vezes pedir o adiamento da audiência não é uma opção, ou você faz ou outro será nomeado. Sobretudo, em comarcas pequenas ou que estão com a pauta abarrotada e querem se livrar dos processos em trâmite.

Contudo, essa situação prejudica apenas o trabalho estratégico do advogado. Pois, conhecer o procedimento legal é uma obrigação.

No entanto, o advogado dativo não serve só para fiscalizar se o procedimento está sendo seguido. Também não serve apenas para validar o ato, por haver um advogado presente na audiência.

Afinal, estamos lidando com um bem muito precioso de uma pessoa e o mínimo que se espera é que façamos isso da melhor forma possível.

E sem dominar o assunto do processo é impossível atuar com estratégia e qualidade técnica que a profissão exige. 

Muitas atuações em demandas mais simples

As causas mais comuns com nomeação de advogados dativos são os crimes de menor potencial ofensivo. Sobretudo os crimes de ameaça e de violência doméstica. Pois, quanto mais grave o crime, maior a chance de a pessoa contratar um advogado particular.

No começo, como você não tem bagagem, qualquer processo, por mais simples, já é alguma coisa, te dando experiência.

Mas conforme você vai pegando esses casos, uma hora você não tem mais nada para tirar de proveito. E aí começa a surgir a necessidade de selecionar, para pegar casos novos ou que de alguma forma irão te acrescentar.

Muitas vezes não vale a pena perder tempo com um processo que não irá trazer nada para ampliar os seus conhecimentos.

Visão ruim da advocacia dativa por juízes e servidores

Muitos juízes, promotores e servidores podem tender a não ver o advogado dativo com bons olhos.

Pois, eles tendem a achar que o advogado dativo não leva o processo a sério ou que só está fazendo aquilo para tirar um trocado a mais.

Cabe a você fazer a diferença e surpreender. Pois, ainda que atuando como dativo, eu sempre dei o meu máximo, como se fosse para um cliente particular.

Vale a pena atuar como advogado dativo?

Tenha em mente que a advocacia dativa pode ser usada como um “estágio”. É uma forma de ganhar experiência e ganhar mais conhecimento prático.

Isso faz com que as desvantagens da advocacia dativa sejam toleráveis e você fica disposto a correr o risco. Enquanto os benefícios são usufruídos da melhor forma.

Aqui aquela máxima de que “a prática leva a perfeição” faz todo o sentido. 

Não importa ser só estudioso e dominar a teoria, pois, nada substitui a prática. Só ela te tornará um advogado e profissional cada dia melhor.

Só a prática nos mostra o quanto ainda temos que aprender e a quantas situações inusitadas estamos expostos.

Cada processo pode nos ensinar alguma coisa e nos exigir uma nova habilidade.

Por isso, atuar como dativo é uma forma de você vivenciar vários cenários jurídicos em pouco tempo.

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