A realidade que vivenciamos é a de um judiciário cheio de processos e juízes tendo que analisar e proferir várias decisões por dia. Essa situação exige que o advogado seja objetivo na hora de redigir uma peça processual.

Claro que, se é necessário que a sua peça processual seja grande, é obrigação do juiz analisar tudo. Contudo, se você prolonga ou “enche linguiça”, o juiz não vai dar muita atenção ao seu pedido, a verdade é essa.

Portanto, siga as sugestões passadas nesse artigo para fazer suas peças processuais cada vez mais com excelência, sendo elas:

Boa técnica processual

Em primeiro lugar, para que sua peça seja excelente você deve usar a estrutura técnica correta de cada peça.

Por exemplo, você deve saber se naquela peça você pode entrar no mérito da causa ou fazer requerimentos.

Você também precisa saber quais os tipos de pedidos podem ser feitos. Pois, é comum você se deparar na prática com peças que tenham pedidos e alegações que não fazem parte dela.

Um exemplo é pedir, na resposta à acusação, a absolvição do réu pela dúvida, com base no in dubio pro reo. Esse argumento é inútil neste momento, devendo ser usado nos memoriais.

Outra situação é identificar o nome da peça de forma correta. Por exemplo, não confundir pedido de liberdade provisória com revogação de prisão preventiva ou relaxamento de prisão.

No entanto, esse erro não é praticado só por advogados, mas também por membros do judiciário.

Parece básico, mas é preciso se atentar ao nome das peças e qual deve ser usada em cada momento processual.

Nos crimes de tráfico de drogas, por exemplo, a primeira peça defensiva não é a resposta à acusação, mas sim a defesa prévia.

Saiba também como se referir às partes do processo. Por exemplo, quando se referir ao seu cliente como denunciado ou acusado. Além disso, o acusado é interrogado, a testemunha é inquirida e presta depoimento e a vítima presta declarações.

Por mais que alguns desses erros não façam o seu pedido ser indeferido, demonstrar domínio técnico faz toda a diferença. Sobretudo, para quem irá analisar sua peça.

Personalização

Por que não usar modelos de peças processuais?

Não use modelos prontos de peça processual, da internet ou que você já tenha feito. Pois, cada caso é único e possui suas particularidades, o que demanda uma defesa e estratégia específica.

Além disso, essa prática costuma causar erros na sua peça. Inclusive, erros graves que podem prejudicar a defesa do seu cliente e influenciar na decisão do juiz. 

Quais problemas podem ocorrer quando se usa modelo?

Uma situação comum que ocorre é uma peça narrando fatos, situações ou até com nomes de pessoas que não estão envolvidos no processo.

O caso mais bizarro que eu já vi foi em um processo de tráfico de drogas em que dois homens foram presos em uma moto, com uma pequena quantidade de drogas, nada mais. Eu era o advogado de um deles.

O advogado do outro denunciado, na mesma peça, descreveu 5 fatos diferentes e sem nenhuma relação com o que aconteceu. Foi desde ter pegado uma carona de carro, citar walk talks, até dizer que ele foi preso com a namorada, mas a droga era para uso. É claro que esses 5 fatos que ele narrou são de outros processos.

E não pense que isso é algo raro de se ver. O mais comum é acharmos nomes de pessoas que não estão no processo ou a descrição de tipos penais que não estão sendo discutidos.

Estes últimos são erros leves, pois o juiz consegue identificar de quem se fala e o crime que se discute. Contudo, fundamentar a sua peça processual em um fato que não aconteceu vai destruir a sua tese defensiva.

Imagine pedir para que o réu seja absolvido em um crime de tráfico de drogas, alegando que ele não efetuou os disparos que mataram a vítima. Dá vontade de rir, mas é daí para pior.

E não é só para evitar esses erros que seu pedido deve ser personalizado. Pois, quanto mais a sua peça for fundamentada com base no caso concreto, maiores serão as chances de sucesso.   

Portanto, faça sua peça de forma artesanal, do zero, de acordo com o caso do seu cliente, para não cometer esse tipo de erro e para aumentar suas chances de sucesso.

Cuidado com as citações de artigos

Evite fazer citações de artigos notórios na sua peça processual. Por exemplo, não precisa copiar e colar todo o texto do artigo 121, do Código Penal, para se referir ao crime de homicídio.

O pior é quando o advogado quer se referir só ao último inciso de um artigo e coloca na peça do caput até o final, para grifar o inciso necessário. Essa prática só torna seu pedido maior e a leitura cansativa. Pois, o juiz tem que ficar “pulando” para ir onde interessa.

Nesses casos, apenas cite o número do artigo e em qual lei ele está.

Quando transcrever um artigo na peça processual?

No entanto, quando estamos falando de artigos novos, o ideal é que eles sejam transcritos na peça. Outro caso seriam os artigos com mais de uma interpretação, seja em todo o seu texto ou em uma única palavra, ou verbo.

Também é o caso de uma lei muito específica, que não é de conhecimento notório. Por exemplo, uma lei estadual.

Facilitar a vida do seu leitor não é bom apenas para ele. Você também ganha, pois, seu texto receberá mais atenção e sua mensagem será passada com maior clareza.

Citações de jurisprudência e doutrina

Jurisprudências

Quando for citar uma jurisprudência eu aconselho que seja feita no corpo do texto, com uso de recuo 8 e fonte 10.

Quantas jurisprudências devo usar em uma peça processual?

Uma sugestão é usar apenas uma jurisprudência para cada tese. Use duas quando o assunto é controvertido ou para mostrar que um tribunal específico já entendeu aquilo mais de uma vez. Nesse caso, coloque uma jurisprudência no corpo do texto e outra no rodapé.

Outra situação é quando o STF, o STJ e o TJ do estado possuem o mesmo entendimento. Nesse caso, é interessante colocar o entendimento de todos esses tribunais (um de cada) para fundamentar a sua peça processual.

Fora esses casos, colocar várias jurisprudências, de diversos tribunais, é desnecessário e ocupa espaço na sua peça.

Em muitos casos é possível citar apenas a parte da jurisprudência que interessa, sem ter que colocá-la inteira. Isso economiza folhas e facilita a leitura.

No entanto, é preciso ter o bom senso de não usar apenas uma frase fora de contexto de uma decisão. Mas sim, uma parte que reflete o entendimento que foi decidido. 

Como pesquisar por jurisprudências?

Busque jurisprudências por ordem hierárquica, do maior tribunal para o menor. Por exemplo, STF, depois STJ e depois demais tribunais estaduais.

Caso você não encontre no STF ou STJ, por exemplo, veja um tribunal que entenda no sentido da sua tese defensiva.

No entanto, priorize jurisprudências do estado em que o processo tramita, salvo quando não houver.

Há casos em que há entendimentos favoráveis apenas de outros tribunais. Pois, o tribunal do estado em que o processo tramita entende o oposto. Nesses casos você não terá escolha e usará jurisprudência de outros estados.

Um exemplo é o TJ-ES (Tribunal de Justiça do Espírito Santo). É difícil encontrar um entendimento favorável para a defesa no TJ-ES. Nesse caso, é preciso buscar entendimentos de tribunais de outros estados.

Doutrinas

Na falta de jurisprudência sobre o assunto, use citações doutrinárias. Sobretudo, quando o assunto é recente. Além disso, reserve o uso de doutrinas, para casos controvertidos e mais peculiares.

Não importa o caso, sempre cite doutrinas atualizadas e de doutrinadores renomados. Claro que isso é feito na medida do possível.

Também é válido citar doutrinas em casos que a lei prevê algo, mas, tal previsão sofre várias críticas ou vai de encontro a alguns princípios do nosso ordenamento jurídico.

Um exemplo é o artigo 310, §2º, do CPP, que veda a liberdade provisória de quem integra organização criminosa. Isso é um tema atual e que sofre muitas críticas da doutrina, sendo uma das principais fontes de fundamentação.

Outra sugestão é citar em sua peça processual os doutrinadores que o juiz lê. Isso serve também para o promotor.

Uma forma de descobrir isso é vendo outras decisões e manifestações, tanto do juiz quanto do promotor.

Caso você vá até o gabinete do juiz ou até à promotoria, analise os livros que estão sobre as mesas.

Evite poluição visual na sua peça processual

Tenha em mente que na sua peça o que importa é o conteúdo, a forma como ele é escrito e como a mensagem é passada ao leitor.

Claro que isso também envolve o conhecimento técnico e a boa fundamentação jurídica. Sendo assim, tudo isso importa mais do que a estética do papel, ou seja, timbrado, marca-d’água e rodapé.

É claro que suas peças não devem ser feitas em um papel em branco, sem nenhuma logomarca, por exemplo. A questão é que você deve evitar logomarcas exageradas e chamativas.

Pois, desenhos e símbolos exagerados tiram o foco do conteúdo e tornam a leitura desagradável. Quanto a marca-d’água sugiro não usar nem mesmo uma discreta.

Algumas coisas beiram o absurdo, como um caso que foi parar na internet, de um advogado que usava o rosto dele como marca-d’água.

Quanto menos informações que possam distrair o seu leitor melhor. Portanto, faça uma logomarca e rodapé pequeno e que não atrapalhem o que de fato importa, que é o conteúdo da peça.

Faça uma revisão “pente fino” na sua peça processual

Linguagem simples

Todo advogado tem seu estilo de escrita, com seu próprio vernáculo e isso não é problema. O que não pode ocorrer é enrolação com palavras difíceis. A correria diária não permite perder tempo lendo uma peça processual com frases rebuscadas e expressões do Brasil Colônia.

Não é para ser grosseiro ou desrespeitoso. Só basta não exagerar na adulação. Eu já vi um pedido em que o advogado usou 4 linhas só para cumprimentar o juiz.

Parágrafo curto

Substitua palavras grandes por pequenas

Faça parágrafos curtos, com no máximo 4 linhas. Para tanto, após terminar a peça processual, releia, procurando palavras que possam ser retiradas ou substituídas por uma menor.

Por exemplo, trocar “utilizar” por “usar”, “acontecer” por “ocorrer”. Faça esse exercício de substituição com as palavras que possuem 4 sílabas ou mais, sempre que possível. Para tanto, veja no Google um sinônimo mais curto para aquela palavra. 

Evite excesso de advérbios

Outra sugestão para encurtar os parágrafos é evitar excesso de advérbios. Pesquise no Google por “lista de advérbios” e retire do texto palavras que sem elas a frase não tem o seu sentido alterado.

Evite usar palavras e expressões em latim

Não use palavras e expressões em latim, com exceção daquelas que não possuem uma palavra mais fácil para ser substituída e são mais comuns.  

Evite frases longas

Tente passar a ideia da melhor forma, mas sem ficar dando voltas ou se prolongando. Por isso, evite também frases longas, sempre que possível, coloque um ponto final e inicie uma nova frase.

Nesse caso, evite repetições, bem como ficar indo e voltando no mesmo assunto. Também evite redundância, use suas palavras com o que interessa.

Use bullet points

Coloque “bullet points” para as frases que vem depois de dois pontos. Essa prática melhora a legibilidade do seu texto.

Faça a formatação do texto

Lembre-se, tudo comunica. Nesse sentido, um documento sem formatação, passa uma imagem de desleixo e desorganização.

Dessa forma, elabore um documento bonito, estruturado e formatado. Pois, além de passar credibilidade, vai facilitar a leitura. 

Hierarquia de título

Destaque os títulos e subtítulos e os diferencie no tamanho da fonte. Use fontes maiores para os títulos e menores para os subtítulos.

Destaque o texto com moderação

Sempre que escrevemos um texto ou peça processual, temos algo que precisa ser destacado. O motivo é simples, aquilo tem grande importância e não pode passar despercebido pelo leitor.

Portanto, o destaque chama atenção do leitor para o ponto central, aquele que não pode ser ignorado. Além de facilitar a identificação de sujeitos no seu texto. Por exemplo, o nome de uma testemunha. 

Os destaques podem ser feitos de várias formas, sendo os mais comuns o uso de CAIXA ALTA, sublinhado, negrito e itálico.

No entanto, não saia destacando tudo no seu texto, pois, isso só irá dizer que tudo tem a mesma importância, ou seja, nada tem destaque. Sendo assim, use esses recursos com moderação e intenção. 

Escolha a fonte certa

Quando for escolher uma fonte, opte pelas simples e que facilite a leitura. Isso torna o seu texto agradável aos olhos e menos cansativo, retendo mais a atenção do seu leitor e sendo mais escaneável.

Em síntese, as fontes com serifas são aquelas que possuem traços, como a Times New Roman. Elas passam uma imagem conservadora e tradicional. Por outro lado, as fontes sem serifas passam uma imagem de modernidade.

Quantas páginas deve ter minha peça processual?

Não há uma regra de quantas páginas uma peça deve ter, pois depende do caso. A grande questão é você usar o necessário para fundamentá-las.

Usando todas essas técnicas  você saberá que não está enchendo linguiça e sim fazendo o necessário para aquele caso. Sendo assim, se você precisar de duas páginas para escrever os fatos, tudo bem.

O problema é fazer uma peça grande, mas sem necessidade, por não usar as técnicas de escrita passadas aqui.

Ferramentas para te ajudar na escrita

Algumas ferramentas te auxiliarão nessa tarefa de elaborar uma excelente peça e que prenda a atenção do seu leitor.

Uma delas é escrever no Google drive, pois ele te mostra erros ortográficos que o Word não mostra.

Outra é o site clarice.ai. Ele é um site de inteligência artificial para escritores que pode te ajudar com a questão da ortografia e gramática.

Além disso, é interessante que você tenha noções básicas dos princípios de design.

Esse conhecimento vai ajudá-lo na elaboração das peças processuais e outros documentos jurídicos. Uma sugestão é o livro: “design para quem não é designer”.

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